DEFININDO A LINGUAGEM
Linguagem é a capacidade
comum aos seres humanos de comunicar ideias e sentimentos por meio de um
sistema de signos linguísticos que se relacionam e se opõem.
O homem é um ser gregário e a linguagem é, talvez, o
mais forte traço de convivência humana. Através
da linguagem interpretamos e damos sentido ao mundo. Graças a ela expressamos
nossas impressões e conseguimos atuar no seio da sociedade. Além disso, ela é simbólica, ou seja, é por meio
dela que damos nome às coisas, que fazemos com que algo seja passível de tornar-se
objeto do conhecimento humano.
Extrapolando o plano puramente referencial, chega-se
mesmo a uma aura mística e sagrada: Petter (2019, p. 11), citando o Gênesis e o
mito da etnia Komo sobre a criação, semelhantes na descrição da origem das
coisas e dos seres por meio da palavra, observa que diversas sociedades revestem
a linguagem de um “poder mágico de criar”.
RELAÇÃO ENTRE LINGUAGEM E LÍNGUA
Sendo a linguagem uma “capacidade”, não um fato, fica
claro que ela precisa de algo em que se amparar para manifestar-se. É neste
sentido que entram em cena os sistemas
de signos, a partir dos quais os falantes/escritores organizam
concretamente suas ideias em sentenças significativas e que são sensíveis (no
sentido mesmo de potencialmente percebidas, pela audição, pelo tato, pela
visão) aos ouvintes/leitores. A estes sistemas de signos damos o nome de línguas.
Para chegarmos a tal compreensão, é necessário
estabelecer que consideramos aqui, na esteira de Lyons (2013), apenas a linguagem natural, concretizada a
partir das línguas naturais, por meio de unidades de representação
chamadas de signos linguísticos. Justificamos isso porque não existe apenas a
linguagem natural, nem tampouco apenas existem as línguas naturais. Linguagens
da computação, por exemplo, são artificialmente criadas, assim como línguas
como o esperanto também são artificiais (vale destacar que a LIBRAS é tida,
pelo menos por aqueles que a estudam, como língua natural e pode, portanto,
entrar no campo de consideração da linguística).
A interdependência da linguagem natural com as línguas
naturais é tão forte que Lyons chega mesmo a afirmar: “não se pode possuir (ou
usar) a linguagem natural sem possuir (ou usar) alguma língua natural
específica” (2013, p. 2). É verdadeiramente dificil até mesmo imaginarmos ou
definirmos a linguagem sem associá-la, imediatamente, a um ato comunicativo
específico e concreto, ou seja, a pelo menos dois indivíduos se valendo de uma
língua para comunicar-se.
CARACTERÍSTICAS DA LINGUAGEM
Cremos que existem pelo menos seis características
inerentes à linguagem natural e que conseguem diferenciá-la, primeiramente, de
outras formas de comunicação e, em segundo lugar, das línguas naturais como realizações
específicas da capacidade de linguagem. São elas:
- Interpretativa
- Simbólica
- Expressiva
- Interativa
- Variável
- Criativa
A linguagem é interpretativa
porque é por meio dela que conseguimos tornar a realidade objeto de nossa
compreensão, de nossa reflexão. É simbólica
porque através da linguagem representamos o mundo e nossas emoções, dando-lhes
uma forma, uma imagem sensorial que se nos apresenta mesmo na ausência de tais
realidades no momento da comunicação.
É expressiva
porque podemos utilizar a linguagem não apenas para interpretar e/ou
representar o mundo, algo que seria como que uma função cognitiva que no
indivíduo nascesse e em seu interior morresse, sem ser transmitido ao mundo
exterior. Em verdade, com a linguagem nós externamos nossas impressões das
coisas, que tornamos tais coisas passíveis de serem percebidas pelos demais
indivíduos. Como decorrência disso, a linguagem é interativa. Porque não apenas expressamos o que sentimos, mas no
próprio ato de expressão convidamos o outro ao diálogo, interpretando,
concordando ou refutando, respondendo… Estabelece-se uma troca, uma construção
mútua de significados, um ato conjunto de recriação do mundo.
A linguagem é variável
porque a capacidade que possuímos de representar a realidade pode ser posta em
prática por meio de inúmeras formas. A variação linguística é antes de tudo uma
propriedade de variação da linguagem, por múltipla que é desde sempre, tão
múltipla, inclusive, que em certas ocasiões, para representar um sentimento,
por exemplo, o indivíduo pode até mesmo abrir mão de utilizar uma língua
natural e simplesmente valer-se de um gesto, um silêncio… E tudo isso é
significativo. Por fim, a linguagem é criativa,
porque por meio dela somos capazes de produzir sentenças jamais ouvidas, tratar
de sentimentos até então desconhecidos, e até mesmo expressar não apenas o que
está dado, mas também criar novas realidades, estabelecer a ficção.
APROFUNDANDO O CONCEITO
Por todos esses fatores, é inegável que a linguagem é o ponto de contato do
indivíduo com mundo, tão importante, enfim, que sem ela até a própria
existência do conhecimento seria impossível, posto que só podemos refletir
sobre algo a partir do momento em que lhe atribuímos um nome, um conceito.
Expressividade e conhecimento se unem na linguagem.
Entretanto, não se confunda “expressão” com “retrato”.
A esse respeito, cabe a colocação de Azeredo:
A linguagem não retrata o mundo, simplesmente porque o
mundo expresso pela linguagem não é um mundo de seres e objetos, mas um mundo
de significados. Se a linguagem fosse um retrato do mundo, a ficção e a mentira
seriam impossíveis (2013, p. 46).
Simbólica e significativa: eis as características da
linguagem que fazem dela uma capacidade
inerentemente humana. Nenhuma forma de comunicação animal consegue ser tão complexa e alcançar os níveis
de expressão dos sentimentos e criação de ficção. A comunicação animal, por
mais que sirva a fins práticos de sobrevivência e saciedade das necessidades
básicas, jamais consegue alcançar o plano da simbologia e da inventividade.
Quando um animal emite um som ou realiza determinado movimento ele está
aplicando a convenção própria para representar determinada coisa (alimento,
ameaça de predadores etc.). Ele não consegue, fora daquele contexto, repetir o
gesto, ou mesmo, num mesmo contexto, inventar uma nova forma de comunicação. O
homem não: ele refaz, aperfeiçoa, modifica e é capaz de repetir aquilo para,
por exemplo, contar uma história num momento bem distante da situação prática.
Jean-Paul Bronckart também trata dessa questão:
os episódios comunicativos do mundo animal apresentam
um caráter fundamentalmente acionador.
A correspondência entre o sinal e a resposta comportamental é direta, não se
faz objeto de nenhum procedimento de negociação (e, portanto, de contestação),
como mostra a aparente ausência de diálogo: o animal não responde ao sinal
emitindo um outro sinal e se engajando em uma “conversação” (BRONCKART, 2012,
p. 32 – grifo do autor)
Outro ponto importante de ser observado é o que diz
respeito à linguagem enquanto objeto da ciência linguística. Neste sentido,
embora possamos conceber como possível a existência de “diversas linguagens”,
utilizando-se de meios os mais diversos possíveis e adentrando ramos como a
tecnologia (linguagem de programação) e outras formas de comunicação (como
linguagens de sinais), é basicamente a
linguagem humana articulada num sistema linguístico que constitui o objeto da
linguística.
Sobre a relação entre a linguagem e as línguas, cabe
citar o seguinte trecho:
Entendendo linguagem como uma habilidade, os linguistas
definem o termo como a capacidade que apenas os seres humanos possumem de se
comunicar por meio de línguas. Por sua vez, o termo “língua” é normalmente
definido como um sistema de signos vocais utilizado como meio de comunicação
entre os membros de um grupo social ou de uma comunidade linguística (CUNHA;
COSTA; MARTELOTTA, 2020, p. 16).
Por tudo o que ficou dito, é possível perceber a
linguagem como a capacidade humana de interpretar e dar significados ao mundo
por meio da interação linguística. É, ao
mesmo tempo, inata e socialmente determinada, porque tal capacidade só se
desenvolve com o contato com outros indivíduos. Além disso, é uma forma de agir no mundo, de atuar
no seio da sociedade.
LINGUAGEM VERBAL, NÃO-VERBAL E MISTA
Com o desenvolvimento da ciência linguística,
percebeu-se a necessidade de se considerar outras formas de manifestação da
linguagem que não seja apenas a linguagem verbal. Neste sentido, surgiram os
conceitos de linguagem não-verbal e linguagem mista. Vejamos:
- Linguagem
verbal: constituída a partir de palavras e textos.
- Linguagem não-verbal:
constituída a partir de símbolos, imagens, gestos etc.
- Linguagem
mista: é aquela que une palavras e simbolos ou imagens
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Professor Weslley Barbosa